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Projeto de lei quer que animais passem a ter mais direitos

A cena não é rara. Ana Paula Vasconcellos, advogada do Fórum Nacional de Proteção e Defesa dos Animais , que reúne 130 entidades no país, está numa audiência jurídica e precisa convencer o magistrado de que um animal, vítima de maus tratos, tem sentimentos e que, portanto, sofreu. Ela costuma ouvir a réplica: “Animal não sente, animal é coisa”. É desta forma, afinal, que a legislação brasileira entende o animal: como um bem móvel, de acordo com o artigo 82 do Código Civil .

Um projeto de lei, aprovado na semana passada pela Comissão do Meio Ambiente do Senado e que vai a votação no Plenário em agosto, pretende mudar isso. Apelidado de “Animal não é coisa” , o texto propõe que os bichos sejam entendidos como seres sencientes, ou seja, capazes de sentir dor, prazer e outros sentimentos. Se aprovada a lei, eles passam a ter inclusive uma personalidade jurídica, podendo, por exemplo, receber habeas corpus ou outros instrumentos legais úteis para sua proteção.

— É a construção de uma sociedade mais solidária com seus animais. O principal ponto filosófico da lei é afastar a ideia utilitarista que a sociedade construiu acerca dos animais. Vamos reconhecer, enfim, que o que os difere do ser humano é racionalidade e comunicação verbal. No mais, eles são como nós mesmos — afirma Ana Paula Vasconcellos.  Ela acrescenta que a lei será um mecanismo para pleitear na Justiça mais direitos aos animais.

— Hoje, quando vou para uma audiência de maus tratos, preciso sensibilizar o juiz e, embora haja jurisprudência para entender que os animais sentem, na letra fria da lei, eles são coisas.  Se entendidos como coisas, os animais não conseguem receber medidas de proteção rápidas na Justiça.

A cantora Rita Lee e a ursa Rowena, que inspirou seu novo livro, “Amiga ursa” Foto: Guilherme Samora / Divulgação

O presidente da Comissão Nacional de Proteção e Defesa dos Animais da  Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) , Reynaldo Velloso, cita um caso emblemático recente, o da ursa Marsha. Siberiana, ela ganhou a alcunha de “a ursa mais triste do mundo” por viver no calor tórrido do Piauí e aguardar, sob sol escaldante depois de décadas de trabalho em circos, a decisão da Justiça sobre sua transferência para um santuário no interior de São Paulo.

Hoje, Marsha mudou de nome — agora é Rowena —  e, há dez meses, habita uma área com piscina e gramado num rancho na cidade de Joanópolis.  Se a ursa tivesse sido considerada um senciente pelos tribunais, a transferência, que levou quase um ano, poderia sair em dias, com um habeas corpus, por exemplo — explica Velloso.

— Houve uma época em que a humanidade escravizava seres humanos e dizia que não tinham alma e, por isso, eram apenas objetos de uso pessoal. Essa mesma mentalidade  ainda acontece hoje em relação aos maus-tratos que o reino animal vem sofrendo. Todos os bichos têm os mesmos sentimentos que os humanos e cabe a nós dar voz a eles.

Para Leandro Mello Frota, professor de Direito Ambiental da Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj), se aprovada, a lei será uma “atualização legislativa necessária ao Brasil”.  — Esta já é uma discussão feita há muito tempo pelos ambientalistas e que vem ganhando mais espaço na sociedade, com os controversos testes em animais, os confinamentos, os parques temáticos. Tudo isso terá de ser reavaliado a partir da concepção de que os animais sentem e sofrem como nós, os humanos.

Fonte: O Globo

         Imagem capa: Pixabay

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